Músicas tradicionais em Moçambique*

A concepção duma peça musical e os detalhes da sua forma são influenciadas não só pela sua estrutura linguística ou intenção literária, mas também pelas actividades a que está ligada. A música Moçambicana é muitas vezes apresentada em contextos que dramatizam relações sociais, crenças, histórias, e acontecimentos comuns. Por isso a música é integrada com a dança e obrigada a sublinhar e desenvolver aqueles aspectos que podem ser articulados no movimento corporal.
A importância atribuída à dança não é só por causa das oportunidades que ela proporciona para a libertação da emoção, estimulada pela música. A música pode ser também utilizada como um meio de comunicação artística e social. A dança por sua vez pode transmitir pensamentos e assuntos de importância pessoal e social, através da selecção dos movimentos, posturas e expressões do rosto. As danças podem demonstrar reacções colectivas em atitudes de hostilidade, cooperação, amor, ou outras. Podem atacar os inimigos ou expressar aspirações através da escolha da coreografia apropriada ou de gesticulações simbólicas.
Gestualidade
Quando um dançarino liga os seus braços com outro, numa dança de Makwayela por exemplo, ele está a dizer «nós estamos unidos na nossa luta comum». E quando ele aponta com um dedo a cabeça, significa que «é um assunto para a minha cabeça, uma coisa para pensar e que vamos resolver juntos». — A dança é um meio de expressão que pode ser relacionado com temas e propósitos de diversas ocasiões sociais. Por exemplo, as danças como Zorrre que, antigamente se seguiam às colheitas, não só celebravam uma boa colheita mas simbolizavam também uma expressão de esperança para a fertilidade em geral, e para a vida da comunidade, especialmente para a vida das mulheres, crianças e do gado. Para dramatizar esta dependência sobre a produção e a reprodução, o Zorre era apresentado normalmente nas noites de lua cheia (que tem normalmente um significado de fertilidade feminina).
Os movimentos básicos
Os movimentos utilizados nas danças tradicionais podem ser simples ou complexos na sua concepção. O Chilembe é uma dança relativamente lenta em comparação com outras danças do Sul de Moçambique. Os únicos instrumentos que são utilizados são o Pala-Pala e um par de colheres planas que as dançarinas batem nas mãos. Às vezes algumas dançarinas seguram um instrumento do trabalho (enxadas, etc.) com a mão esquerda. Quando elas cantam, batem na terra com o pé direito para marcar o compasso forte, fazem um passo leve e curto com o pé esquerdo para a frente, no compasso fraco. O corpo inclina-se um pouco para a direita quando o pé toca no chão. Nesta dança há os movimentos básicos da dança Chingomana. Aqui temos aparentemente um modelo mais complexo dos passos básicos, contra o que parecem ser movimentos independentes das várias partes do corpo. Enquanto os pés se movem regularmente em compassos de dois, o corpo pode estar a mover-se numa posição semi-circular com as mãos e os braços fazendo movimentos diferentes.
Mover os músculos da cintura
Noutras danças, em vez de mover todo o tronco num ritmo simples, os movimentos acentuam-se na parte superior. No Zore por exemplo, são principalmente os músculos da cintura e do estômago que estão em movimento. Por outro lado em danças como o Makwai, são acentuados os movimentos das partes superiores do corpo. Pode ser rotação ou movimentos para cima ou para baixo das omoplatas, ou expansão do peito, acompanhando os diversos movimentos dos braços, a contracção e libertação das omoplatas. Combinados com esses, há movimentos que podem estar acentuados num momento específico ou em sequências repetidas e que caracterizam danças particulares, como parte do movimento básico. Esses movimentos incluem ondulações dos músculos (dança Ms ah o ); bater os pés (dança Makwai); andar curvado (dança Chigubo); saltar (dança Ngalanga) etc. No essencial as diferentes danças do Sul de Moçambique distinguem-se pelas normas dos movimentos escolhidos. A mesma série da sequência dos movimentos, não é utilizada em todas as danças. Há uma tendência de sublinhar mais alguns movimentos, do que outros. A diversidade estende-se para a qualidade, sincronização e a sequência dos movimentos. Na dança Makwai os movimentos são mais vigorosos e agudos na qualidade, do que por exemplo os da dança Muthimba. Superficialmente parecem ao espectador exigir muito esforço físico, mas muitas vezes isto é uma ilusão criada pela qualidade e velocidade dos movimentos.
*Texto de John Marney, músicas tradicionais de Moçambique, Ministério da Educação e Cultura, 1980