Distribuição de dividendos dos recursos é bomba relógio

O actual modelo de transferência dos 2,75% para as comunidades afectadas pelos recursos minerais pode gerar desigualdades económicas e sociais. É a constatação do Centro de Integridade Pública (CIP) que adverte para a necessidade de revisão da taxa de 2.75% para 5.75%. Entretanto, o advogado João Líbero diz haver necessidade de redistribuição nacional desse fundo de modo a evitar assimetrias uma vez que existem planos de desenvolvimento de todos distritos do país.
O estudo do CIP admite que há uma questão recorrente ligada a exploração de recursos naturais que se prende aos potênciais ganhos que eles geram para o país e para as comunidades afectadas pelas operações extractivas. A exploração, segundo o documento expõe as comunidades a fortes externalidades negativas em geral caracterizadas pela degradação ambiental, perda de ecossistemas, empobrecimento das condições socioeconómicas, e conflitos. “Neste âmbito, o governo tem definido sistematicamente desde 2013, através da Lei do Orçamento do Estado (LOE), a percentagem de 2,75% que incide sobre o imposto de produção para transferir às comunidades que hospedam projectos extractivos” lê-se no estudo que analisa ainda as dinâmicas da determinação, canalização e alocação das transferências dos 2,75% da receita do imposto sobre produção mineira e petrolífera para as comunidades e suas consequências no desenvolvimento local e concluiu que, o processo actual de partilha de receitas em Moçambique não é transparente tanto a nível da determinação do volume de receitas bem como a nível da gestão dos fundos no distrito.
O CIP refere ainda que o modelo actual não distingue as transferências de receitas para as comunidades (os 2,75%), das transferências do Orçamento do Estado para os Governos Distritais. Isto permite uma sobreposição de projectos e corrupção na gestão. No modelo actual, os investimentos não são geradores do desenvolvimento para as comunidades beneficiárias, mas, um potencial de geração de desigualdades muito profundas e críticas para a estabilidade social e política uma vez que os recursos são concentrados em comunidades exclusivas no distrito, colocando as demais comunidades adjacentes ao distrito sem quaisquer benefícios da exploração de recursos.
Neste sentido a organização recomenda a necessidade de alteração do actual fluxo de transferências das receitas de partilha com as comunidades que é feita por via do orçamento do Estado para um fluxo fora do orçamento do Estado. “Criar um órgão independente para a gestão e execução das receitas das transferências para as comunidades”, lê-se no documento que acrescenta a necessidade de mudança de mecanismos de alocação, gestão e determinação dos projectos de desenvolvimento comunitário para promover maior transparência e eficácia nos resultados da implementação dos projectos.
A organização sublinha ainda a necessidade de se aumentar a percentagem da taxa de partilha de receitas para 5.75% de modo a incluir comunidades do distrito produtor não directamente afectados pelos projectos extractivos e actualmente excluídos nos benefícios das transferências comunitárias e a consolidação dos mecanismos de transferências para as comunidades que permita reduzir desigualdades e riscos de conflitos nos distritos produtores de recursos naturais.
2.75% abre precedente de conflitos futuros
– Jurista João Líbero
Entretanto, o jurista João Líbero diz que a alocação da receita dos 2.75% deixa a entender que os distritos que hospedam projectos mineiros devem evoluir graças ao investimento do sector. Mas o programa do desenvolvimento do distrito ou do país não deve ter por base o investimento local.”Ter por base todo país, localmente a nível central também. Essa percentagem ainda que seja revista não deve ser para o investimento local. Mas, sim para o país” disse a fonte acrescentando que se o investimento mineiro, por ventura, enfrentar por crises mundiais isso pode significar que as comunidades estarão refém do desenvolvimento. A minha pergunta é: como cidadão moçambicano vai haver evolução no meu distrito havendo gás, petróleo ou carvão? O desenvolvimento não pode acontecer por causa da alocação do valor de produção, deve ser na base de um conjunto de factores de investimento em vias de acesso, agua e luz. Só de garantir essa base, este local vai desenvolver sem precisar do incentivo dos 2.75%.
Este incentivo de 2.75% ainda segundo Líbero independentemente de se aumentar a percentagem deve ser canalizado centralmente e posteriormente para ser redistribuída em todas as províncias de maneiras a evitar-se o regionalismo.
“A maneira actual de fazer a gestão desses fundos, hoje pode parecer boa. Porém, futuramente pode gerar conflitos. A riqueza deve ser distribuída para todos moçambicanos. Eu que estou longe de uma região onde não jazem os recursos naturais tenho direito de usufruir desse investimento nacional que está num determinado distrito isolado do meu”, argumenta o jurista acrescentando que os benefícios não devem ser localizados, “aliás, os benefícios locais devem ser na base das infra-estruturas, vias de acesso, agua, luz. Isso é que é o verdadeiro factor impulsionador de desenvolvimento local”.
“Quando dá um incentivo a um distrito em detrimento do outro abre-se aqui um precedente de desigualdades porque está beneficiar uma determinada comunidade a dobrar em detrimento de outras, abre-se uma situação de guerras e se formos haver em África o maior causador de conflitos são as assimetrias económicas e sociais” disse
Relativamente a gestão não transparente desse fundo, João Líbero entende que quando há uma ausência de lei, a gestão não é feita de forma uniforme o que abre espaço para aproveitamento por parte das pessoas que fazem a gestão. “Está sendo difícil criar normas de gerir esses valores de forma clara e universal por isso, sou da opinião da necessidade de alocação desses valores ao governo central “sublinhou
Temos que olhar para os lucros das mineradoras
– Carimo Freitas
O deputado e membro da comissão de agricultura economia e ambiente, Carimo Freitas de Oliveira, entende que as mineradoras têm várias responsabilidades. Desde os reassentamentos, compensações e responsabilidade social e inclusivamente os 2.75%. Para Carimo Freitas antes de se fazer qualquer análise sobre essas matérias, é necessário que se olhe para os lucros das mineradoras.
“Se for para olhar para o benefício do povo seria muito bom. O membro da quinta comissão admite ainda que se elevarmos a percentagem para 5.75% sem olhar para a variável de lucro, podem as mineradoras manifestarem o abandono de investimento situação que pode aumentar mais a pobreza naqueles lugares que um dia tiveram impulso decorrente do investimento do sector extractivo”, começou por explicar.
“Dependendo daquilo que são as despesas que envolvem dinheiro. É preciso olhar que todo investimento feito deve ter lucros, claramente que no sector de indústria extractiva há um tratamento especial dessas matérias. Esses 2.75% reflectem aquilo que é o ganho. Mas, que se formos a fazer uma análise global não são só os 2.75%. existem os reassentamentos, responsabilidade social e compensações cujo valor para essa toda cadeia de direitos das comunidades não é pouca”, acrescentou.
Sobre a gestão dos fundos, Carimo Freitas explicou que as comunidades sempre participam nas decisões finais do fundo. Existe um conselho consultivo criado que faz o levantamento das preocupações da comunidade e quando se aloca o fundo faz-se a efectivação dos projectos. “Uma coisa que não seria certa, é pegar no fundo e distribuir para as comunidades” entende
Por ultimo o mandatário do povo salientou que há um prejuízo das comunidades afectadas pelos projectos de exploração mineira o que no seu entender deve ser repostas as externalidades através da alocação desses fundos, responsabilidade social entre outras acções.Se optarmos pela redistribuição nacional,os valores não serão visíveis porque Moçambique é vasto.
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